sexta-feira, 14 de janeiro de 2011

Mulheres Homens

Ursula Burns

Elas são a personificação dos processos corporativos: multidisciplanadas, multidisciplinares, adaptáveis e, assumidamente, pouco sentimentais. Tomam de 30 a 50 decisões por dia com certa facilidade, seguindo à risca um padrão viciante e centralizador.

Costumam criar e recriar projetos, rever prognósticos, imaginar cenários, repensar detalhes e, por fim, decidir.

Podem ficar por mais de 10 minutos se olhando no espelho em busca dos porquês, e não em busca dos sinais do tempo. Pelas manhãs, exalam a fragrância do otimismo e da sapiência em cada bom dia, mesmo estando sob forte pressão.

Elas são executivas, diretoras executivas, presidentes ou simplesmente chairwoman's. Elas estão no alto escalão: ministras, governadoras, chefes de estado, pessoas de grande influência.

Preferem a crítica pontual ao ponto final. Costumam responder com olhares introspectivos ao invés de falas prontas. Quando o diplomático boas-vindas torna-se obrigatório, um sorrir comedido e um tradicional aperto de mãos já são o bastante.

Elas trabalham full time, extra time, time after time e nunca estão offline. Quando resolvem dormir, seu cérebro reascende ao toque do smartfone. Elas são mães, filhas, netas, amigas, amigas de poucas amigas, ou não. Enfim, pessoas cumulativas que pluralizam a vida de uma maneira singular.

Falam muitos idiomas, não necessariamente linguísticos e dominam três dialetos fundamentais: corporativês, economês, politiquês.

Elas têm um senso de sobrevivência fora do comum e costumam resistir a altas e baixas temperaturas do mundo dos negócios. São flamantes quando perdem a cabeça, são gélidas quando cortam cabeças. Contudo, equilibram-se nas cordas bambas do ser ou não ser.

Como excercício e não como hobby, jogam xadrez ou golf - e até arriscam um simulador de vôo. Suas noções espaciais e periféricas são acima da média e definitivamente, não são nada estabanadas.

Elas percebem, enxergam, decodificam e transmutam oportunidades em segundos, provando que computadores não têm visão sistêmica. Como se não bastasse, elas criam e reinventam conceitos, jovializam propositalmente velhas máximas, numa tentativa de revitalizar os estereótipos da meia-idade.

Muitos homens as consideram dinamicamente assustadoras ou rivais eternas. E, se existir atração física entre ambos, dificilmente haverá algo a mais do que sexo ocasional. Talvez e bem talvez, um platônico romance poderá surgir.

Elas optam pelo prestígio, porque a fama não está associada ao poder. Elas são calculistas, metódicas, econômicas e projetam os próximos 5 anos como se fossem 5 meses. Porém, aqui vai um alerta: Mulheres Homens não são assexuadas, solteiras convictas, frígidas, inimigas ou incapazes de amar. Apenas ultra-corporativas.

Sim, elas são mulheres, as novas mulheres.

Elas são Mulheres Homens.

sábado, 8 de janeiro de 2011

Detesto, Mas Venero

Detesto a falta de conexão das pessoas com as pessoas, mas venero olhar pessoas como pessoas. Detesto não compreender o incompreensível, mas venero a fragilidade do mundo plausível. Detesto a patifaria reminiscente do político, mas venero o reincidente espancamento crítico. Detesto conjugar critérios da vida alheia, mas venero todos aqueles que tecem a própria teia. Detesto o longo discurso dos que buscam perguntas às respostas, mas venero a sutileza dos que encontram respostas às perguntas. Detesto a complexidade aparente das grandes coisas, mas venero a simplicidade presente nas pequenas coisas. Detesto o engodo dos pseudo-intelectuais, mas venero a falsa cúpula dos acadêmicos imortais. Detesto tudo aquilo que me enfraquece em dias normais, mas venero perder forças em atos banais. Detesto o apodrecer da comida na encruzilhada, mas venero o enrijecer da mosca envenenada. Detesto a cartilha do rigor diplomático, mas venero o manifesto em prol do lunático. Detesto a contrapartida dos chefes de estado, mas venero o ímpeto do filho bastardo. Detesto o bajular rebuscado do galanteador, mas venero o beijar roubado do namorador. Detesto os documentos que atestam minha saúde mental, mas venero a feroz eloquência do surrealismo letal. Detesto saber que nada sei porque tudo busco, mas venero lamber o prato que a cada dia cuspo.